P. EaD: Filmes, Séries, Novelas e o Unschooling
Se tem uma coisa que a nossa jornada de unschooling me ensinou é que o aprendizado não respeita as fronteiras dos livros didáticos nem cabe nas paredes de uma sala de aula. Ele transborda. Ele se esconde nos detalhes do cotidiano, nas conversas despretensiosas, nos jogos, nas músicas, nos filmes, nas novelas e nas séries que, de alguma forma, escolhemos (ou somos escolhidos por elas) para acompanhar. Ao longo dos anos, percebi que essas narrativas audiovisuais não são apenas entretenimento — são janelas abertas para o mundo, para dentro de nós mesmos e para o outro.
Quando Ana e Davi começaram a mergulhar mais profundamente nas séries, nos filmes e até nas novelas, o que vi não foi uma fuga da realidade, mas justamente o oposto: um encontro. Encontro com dilemas éticos, com tensões sociais, com culturas diferentes, com os próprios sentimentos, com perguntas que talvez nunca surgissem em um livro de história. Assistir se tornou uma prática ativa, quase meditativa. A cada episódio, a cada personagem, a cada desdobramento, víamos juntos a complexidade da vida sendo encenada, decifrada, desmontada e remontada na tela — e dentro deles.
Foi nesse percurso que conheci o trabalho da pesquisadora Lisa Zunshine, no livro Why We Read Fiction, que trouxe uma chave que, para mim, virou ouro no nosso caminho. Ela explica que, quando nos envolvemos com histórias, acionamos uma habilidade chamada Theory of Mind, ou Teoria da Mente. É isso que permite que a gente imagine o que o outro está pensando, sentindo, desejando. E, sem perceber, ao tentar entender porque aquele personagem fez tal escolha, ou porque agiu de forma tão incoerente, estamos, na verdade, treinando uma habilidade essencial para a vida: a empatia. Ler mentes no sentido mais humano da expressão. Adivinhar desejos, captar silêncios, perceber o não dito. E então, de repente, ficou óbvio pra mim que aquilo que tantos chamam de “perda de tempo na frente da TV” podia, na verdade, ser um exercício profundo de inteligência emocional e social.
Cada série que eles escolhiam se tornava um convite para conversas que, muitas vezes, se estendiam por dias. E não eram apenas conversas sobre o que aconteceu na trama, mas sobre o que não foi dito, sobre as contradições dos personagens, sobre o que fariam diferente, sobre como aquilo espelhava — ou não — o mundo real. Quando assistimos juntos a determinadas novelas, percebemos como certos discursos se repetem, como alguns estereótipos se perpetuam, e também como alguns roteiros ousam romper, provocar, desestabilizar certezas.
Era impressionante ver como, naturalmente, eles começavam a identificar arquétipos, padrões narrativos, construções simbólicas. Uma personagem que parece vilã, mas na verdade carrega traumas não elaborados. Um mocinho que não é tão mocinho assim. Uma decisão que parecia correta, mas olhando por outro ângulo… talvez não fosse. A todo momento, estavam treinando não só o pensamento crítico, mas também aquele olhar generoso, capaz de compreender que por trás de cada ação há um emaranhado de histórias, feridas, sonhos e medos.
E, claro, não dá pra ignorar o quanto isso também se tornou uma forma de exploração cultural. Cada série ambientada em outro país nos fazia mergulhar naquele idioma, naquele jeito de viver, naquela estética. Às vezes pausávamos para procurar no mapa onde se passava tal história, ou íamos atrás de entender algum contexto histórico citado meio de passagem. Aprender se tornou uma teia, onde nada está isolado. Ver um filme de época não era só ver um filme — era aprender sobre os costumes, as roupas, os conflitos sociais daquele tempo. Assistir a uma série contemporânea de outro país era quase como viajar, espiar uma cultura viva, cheia de suas próprias contradições.
E que potência isso tem para o desenvolvimento da linguagem! Ver séries em outros idiomas, perceber nuances, sotaques, expressões idiomáticas… Tudo isso sem esforço, sem aquela rigidez da aula formal. O aprendizado acontecia do jeito mais doce possível: pelo desejo, pela curiosidade, pelo afeto.
Quantas vezes um episódio terminou e eles saíram correndo para desenhar, para escrever, para criar suas próprias histórias inspiradas no que tinham acabado de ver. Quantas conversas surgiram, quantas perguntas sem resposta, quantos debates acalorados sobre o que seria a decisão mais justa, mais ética, mais coerente naquele contexto.
E sim, muitas vezes a discussão atravessava também questões muito concretas: racismo, machismo, desigualdade social, conflitos políticos, relações de poder. Tudo vinha junto, embalado na trama, atravessando os personagens, reverberando na vida real. E é justamente aí que reside a potência de trazer filmes, séries e novelas para o centro do nosso currículo de unschooling. Porque não é sobre decorar fatos, datas ou definições. É sobre viver a experiência de pensar, sentir, refletir, se posicionar no mundo.
Essas mídias não são apenas ferramentas de suporte; elas são, muitas vezes, o próprio motor da aprendizagem. Elas criam pontes entre o subjetivo e o coletivo, entre o interno e o externo, entre o que somos e o que podemos vir a ser.
Por isso, neste capítulo, além de celebrar esse caminho, quero também registrar, como memória afetiva e pedagógica, algumas das séries e filmes que marcaram nosso ano, junto com as reflexões e os aprendizados que cada uma trouxe. Porque se é verdade que a vida não cabe num currículo, também é verdade que o currículo pode caber inteiro dentro da vida — e, muitas vezes, dentro de uma boa história contada na tela.
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